//styles, look here: https://cdnjs.com/libraries/highlight.js/9.12.0

September 11, 2018

1369 palavras 7 mins

Explorando o Modelo de Solow com a ajuda do R

Em fevereiro de 1956 foi publicado no Quarterly Journal of Economics o trabalho A Contribution to the Theory of Economic Growth, de Robert Solow. Segundo o Google Scholar o paper acumulou cerca de 26000 citações de lá para cá e isso não deve ser uma grande surpresa.

Apesar de já existirem à época trabalhos importantes na área, como o de Ramsey (1928), Solow é quase um fundador da moderna teoria do crescimento econômico e por suas contribuições importantíssimas à essa literatura foi laureado com o Prêmio Nobel de Economia em 1987. Inclusive, fica a dica de leitura aqui: Assaf (2017) mostra a importância de Solow e seus alunos no MIT para a teoria do crescimento. É história do pensamento econômico de altíssima qualidade.

Aqui, vou apresentar o modelo e depois explorar melhor seus resultados com a ajuda do R.

O Modelo de Solow como visto nos manuais

Antes de entrar na matemática, reproduzo aqui uma passagem de Assaf (2017), descrevendo o modelo:

His model, published in 1956, was a perfect example of MIT’s theoretical style. Solow presented his aggregate production function, identified a steady state that leaned on population growth and technical progress, and a convergence path defined by capital accumulation. More than that, his modelling style defined a literature and made canonical his contribution. A simple, clear and malleable artefact: a model seen as a tool, a drastic simplification of real world complexities, but not a negation of these complexities […]

Pois, partiremos de uma função de produção dependente do estoque de capital, de tecnologia e de trabalho, \(Y: \mathbb{R}^3 \to \mathbb{R}\), monótona e contínua. Também assumimos homogeneidade de grau 1 - por caracterizar retornos constantes à escala e forma funcional Cobb-Douglas. Temos:

\[Y(t) = K(t)^\alpha (A(t)L(t))^{1-\alpha}\]

Estamos modelando tecnologia como Harrod-neutra, aumentadora de trabalho. Uma interpretação é que uma unidade de trabalho fica mais produtiva à medida em que a tecnologia melhora. Não seria o caso se, por exemplo, o termo de tecnologia estivesse multiplicando o estoque de capital. Aí teríamos tecnologia Solow-neutra, aumentadora de capital.

Com isso em mente podemos começar a fazer algumas perguntas.

O que determina a renda por trabalhador?

Estamos interessados em \(\frac{Y}{AL}\), a renda por trabalhador efetivo. Pois, da função de produção podemos rapidamente encontrar isso:

\[Y(t) = K(t)^\alpha (A(t)L(t))^{1-\alpha} \\ \frac{Y}{L} = \frac{K^\alpha (A(t)L(t))^{1-\alpha}}{L} \\\]

Se definirmos a renda por trabalhador \(y := \frac{Y}{L}\) e o estoque de capital por trabalhador \(k:= \frac{K}{L}\), temos então:

\[y = k^\alpha A^{1 - \alpha}\] A renda por trabalhador depende, a rigor, do estoque de capital por cabeça e do nível de tecnologia.

Então como evolui a renda por trabalhador ao longo do tempo?

Podemos explicitar como cada termo evolui e daí chegar em uma trajetória para a renda por trabalhador. Aviso que irei omitir pormenores do passo a passo porque eles estão em qualquer manual de teoria do crescimento econômico. Seja \(\delta\) a taxa de depreciação do estoque de capital, \(n\) a taxa de crescimento populacional e \(g\) a taxa de crescimento do estoque de tecnologia:

\[ \dot{k} = sk^\alpha A^{1 - \alpha} - (n+g+\delta)k \\ \] Observe que em um termo, \(k\) está elevado a \(\alpha < 1\) e o no outro, \(k\) cresce linearmente. Isso indica que eventualmente \(\dot{k}\) fica negativo e sabemos que agentes maximizadores de lucro não irão conscientemente formar capital para ter prejuízo. Essa economia crescerá até que \(\dot{k}=0\).

Manipulando a equação, chegamos em um estoque de capital que satisfaz isso:

\[k^*= A(\frac{s}{n+g+\delta})^\frac{1}{1-\alpha}\] Esse é o estoque de capital no estado estacionário dessa economia, para onde ela converge no longo prazo. Como sabemos para onde o estoque de capital converge, também sabemos para onde vai a renda por trabalhador:

\[y^* = A(\frac{s}{n+g+\delta})^\frac{\alpha}{1-\alpha}\] Observe que a introdução da tecnologia altera radicalmente os resultados. A renda per capita no estado estacionário, num modelo sem o termo \(A\) de tecnologia, é independente do tempo. Países, sem progresso tecnológico, cresceriam até o nível de estado estacionário e lá ficariam - é daí que vem o nome, se você parar para pensar.

O progresso tecnológico joga a barreira para frente, é ele que permite elevação sustentada do padrão de vida no longuíssimo prazo. O Modelo de Solow o trata como exógeno, um “maná” que cai do céu. Eventualmente essa hipótese foi relaxada e já existem modelos voltados para modelar como uma economia produz conhecimento. Essa literatura avançou muito no final dos anos 80 e começo dos anos 90 com trabalhos como Romer (JPE 1990), Grossman e Helpman (EER 1991) e Aghion e Howitt (Econometrica 1992). Talvez um dia possamos explorar o Modelo de Romer aqui no blog, com a ajuda do R. Por enquanto, vamos voltar ao de Solow.

Visualizando isso no R

Qual é o efeito de um choque na taxa de crescimento populacional na renda de estado estacionário? E na taxa de crescimento da tecnologia? Podemos computar isso.

solow_steady_state <- function(n = .01,
                               g = .01,
                               alpha = .5,
                               s = .01,
                               delta = .01,
                               TFP = 1) {

  k = TFP * (s/(n + g + delta))^(1 / (1-alpha))
  y = TFP * (s/(n + g + delta))^(alpha / (1-alpha))

results = list("Capital per capita" = k,
                "Income per capita" = y)
  }

n = seq(from = 0,
        to = .05,
        by = .001)

ss_computado = solow_steady_state(n=n,
                                  s = .15,
                                  g = .02,
                                  alpha = .4,
                                  delta = .02)

grid = data.frame(n,ss_computado$`Income per capita`)

library(ggplot2)
library(dplyr)

grid %>%
  ggplot(aes(x = n, y = ss_computado..Income.per.capita.))+
  geom_line(size = 2, color = "blue") +
  ylab("Renda por trabalhador no Estado Estacionário") +
  xlab("Taxa de Crescimento da População")+
  labs(caption = "s= 15%, g = 2%, alpha = .4 e delta = 2%")

E o que acontece com a renda per capita no longo prazo caso um país passe a poupar maior parcela de sua renda?

s = seq(from = .1,
        to = .5,
        by = .001)

ss_computado2 = solow_steady_state(n = .02,
                                    s = s,
                                    g = .02,
                                    alpha = .4,
                                    delta = .02)

grid2 = data.frame(s,ss_computado2$`Income per capita`)

grid2 %>%
  ggplot(aes(x = s, y = ss_computado2..Income.per.capita.))+
  geom_line(size = 2, color = "blue") +
  ylab("Renda por trabalhador no Estado Estacionário") +
  xlab("Taxa de Poupança")+
  labs(caption = "n = 2%, g = 2%, alpha = .4 e delta = 2%")

Como se divide a renda nessa economia?

Para simplificar, podemos normalizar o índice de preços da economia (que é o preço do produto homogêneo) para 1 e resolver o problema de maximização de lucro. Seja \(r\) a taxa de juros, \(w\) a taxa de salários e \(\pi\) o lucro agregado:

\[ \text{max} \,\,\pi(t) = K(t)^\alpha (A(t)L(t))^{1-\alpha} - wL(t) - rK(t)\] Não precisamos adentrar muito nos pormenores da otimização, vamos nos focar em duas condições de primeira ordem pertinentes à entender como a renda se distribui:

\[w = \frac{\partial \pi }{\partial L} = (1 - \alpha) \frac{Y}{L} \\ r = \frac{\partial \pi }{\partial K} = \alpha \frac{Y}{K}\]

Conhecemos esse resultado da microeconomia, os preços de fatores são suas produtividades marginais. Observe que a esses preços de fatores, a remuneração do processo produtivo exaure integralmente a renda da economia. O leitor pode confirmar isso averiguando se aos preços compatíveis com as condições de primeira ordem fazem com que \(wL + rK = Y\) (um exercício muito breve, diga-se de passagem).

Mais ainda, a participação de cada fator na renda é igual à sua elasticidade com o produto agregado. \(\frac{rK}{Y} = \alpha\) e \(\frac{wL}{Y} = 1 - \alpha\). Parece um resultado simples - e de certa forma é - mas isso nos diz coisas profundas: a distribuição da renda entre capital e trabalho é temporalmente consistente, dependente das produtividades marginais de cada fator. Como cada fator tem produtividade marignal decrescente, à medida que uma economia se desenvolve e acumula capital, uma parcela maior da renda vai para o trabalho.

Renda per capita e desigualdade

Renda per capita e desigualdade

Conluindo

Vimos brevemente com o auxílio do R o efeito de choques em alguns parâmetros no workhorse model do crescimento econômico exógeno e um breve resultado desse modelo para entender como desigualdade se liga com desenvolvimento econômico. Quando voltar a falar de macro, penso em revisitar esse tema no modelo MRW, mostrar como podemos usar o Modelo de Solow para decompor crescimento de países em contribuições específicas de fatores ou explorar o Modelo de Romer.

Até lá